quinta-feira, 23 de setembro de 2010

As asas da liberdade, por Renato Silvano Pulz *

A liberdade é sem dúvida um direito fundamental, muitas vezes conquistado com sangue e suor, que o ser humano aprendeu a valorizar e defender ao longo da história, e o seu maior símbolo é o voo de um pássaro. Sabemos que é um de nossos bens mais valiosos, mas, então, por que, em alguns casos, não conseguimos estender este conceito a outras espécies?

Fiz este introito para comentar um fato inusitado que alterou minha rotina diária. Ao sair de meu prédio, percebi um pássaro no chão, de uma espécie silvestre, mas certamente domesticado, pois se deixou pegar com a inocência e fragilidade de quem confia. Eu bem que poderia permitir que a natureza seguisse seu curso e deixá-lo livre para voar ou para ser predado por um gato. Entretanto, esta decisão não me pareceu justa, visto que, um animal em que a mão do homem interferiu no seu comportamento natural, os instintos de sobrevivência foram aniquilados. Ao colocar o pássaro em uma gaiola e zelar por sua saúde até descobrir seu dono, fiz algumas reflexões e decidi dividi-las com os distintos leitores, que talvez simpatizem ou não com minhas observações.

A maior expressão do comportamento de um pássaro é a ação de voar. É triste observar o animal em uma gaiola, isolado e consumido pelo tédio. Engana-se quem pensa que fornecer água, comida e abrigo torna um animal feliz. Antes que alguém estranhe o fato de atribuir um estado emocional a um animal, explico, para aqueles que desconhecem, que a senciência é a capacidade dos animais de experimentarem sentimentos. É, pois, lógico que um pássaro somente será feliz quando livre e voando entre seus semelhantes.

O costume de ostentar espécies exóticas como adornos e objetos de decoração remonta às grandes navegações, quando conquistadores de novas terras levavam animais como troféus. Mesmo após séculos, o hábito de mantermos animais silvestres aprisionados se perpetua por tradição, alimentando um mercado lucrativo, tanto no comércio regular quanto no tráfico. Uma tradição que vai na contramão da mensagem que devemos passar às nossas crianças, qual seja, de respeitar a natureza e a liberdade. A imagem de um animal livre no seu hábitat natural traduz a própria ideia de liberdade.

Somos responsáveis ética e moralmente pelos animais que não sabem mais viver por seus próprios meios. Se você quer um animal de companhia, adote um cão ou um gato, há milhares deles precisando de um lar.

*Professor universitário

Fonte: Jornal Zero Hora, 22 de setembro de 2010