segunda-feira, 8 de novembro de 2010

ARCA DE NOÉ, por Vanilda Moraes Pintos


ARCA DE NOÉ


A Declaração Universal dos Direitos dos Animais , proclamada pela UNESCO, em Bruxelas - Bélgica, diz em seu artigo 4º :1.Todo o animal pertencente a uma espécie selvagem tem o direito deviver livre no seu próprio ambiente natural, terrestre, aéreo ouaquático e tem o direito de se reproduzir. 2.Toda a privação deliberdade, mesmo que tenha fins educativos, é contrária a este direito. Esta Declaração, apesar de não ter força de lei, denota apreocupação de seus autores em garantir aos animais, o bem maisprecioso na vida de qualquer ser vivo e que deveria ser inalienável: a liberdade.Animais selvagens, cativos em zoológicos em pleno século XXI, exibidos em jaulas ou mesmo em ambientes que tentam mimetizar onaturalismo de seus hábitats, expostos como objetos em uma vitrine, demonstram o quanto o ser humano encontra-se distante de uma postura ética em relação à natureza e aos seres vivos.A alegação de que o cativeiro de animais selvagens é ferramenta deeducação ambiental denota uma absoluta falta de informação atualizadanesta área, bem como uma visão antropocêntrica, equivocada,utilitarista, que tem por base, dispor da vida dos animais para quesupostos benefícios culturais humanos sejam alcançados.Atualmente, a recomendação de quem trabalha em cativeirosconservacionistas é de que os animais permaneçam cativos o mínimo detempo possível, uma vez que a longa permanência em cativeiro os tornaenfraquecidos e diminue suas chances de sucesso ao serem introduzidosou reintroduzidos na natureza.Logo, a intenção de fomentar nascimentos em zoológicos sem apreocupação de fazer a reintrodução destes indivíduos na natureza,mantendo-os infinitamente na condição de cativos denota claramente umaabsoluta ausência de política conservacionista e sim, interesse namanutenção de animais para futuras e possíveis transações comerciais.Outro argumento levantado a favor do cativeiro perpétuo de animaisselvagens é de que as crianças precisam conhecer de perto estesanimais, para que desenvolvam laços afetivos com eles e dessa forma, aprendam a respeitá-los .Importante lembrar que as crianças não precisam necessariamentedesenvolver laços afetivos com animais selvagens, elas precisam sim, édesenvolver obrigatoriamente, respeito por eles e todos os demais seresvivos.Observar à distãncia, eventualmente, animais aprisionados, em nadalhes pode ser positivamente educativo.A noção de respeito é um valor ético e não é preciso contato visualpara que o sentimento desperte no indivíduo.A prova disso é que durante décadas presenciamos nos centros urbanos, adramática situação de abandono e violência as quais estão submetidos cães e gatos, entregues à sua própria sorte por conta dairresponsabilidade humana.Praticamente toda criança convive ou já conviveu com um cão ou gato emsua casa e além disso, presencia diariamente nas ruas por onde anda, o desfile da dor e sofrimento destes animais. No entanto, poucas são asque se propõem mitigar tal sofrimento.A maioria, infelizmente, está anestesiada para a situação devulnerabilidade a qual estão expostos estes animais. A maioriaesmagadora deleita-se em desfilar com cães de raça, perpetuando umaconduta preconceituosa, que faz vitimar milhares de animais a cadadia, todo ano em todos os lugares deste e de outros países.Então, se a convivência diária com seus próprios animais não ésuficiente para despertar nelas um sentimento de empatia, de compaixão, de respeito pelos animais em sofrimento que elas encontram nas ruas,por qual razão haveriam elas, de se sensibilizarem com a figura de umanimal selvagem exposto em uma jaula, e que com certeza absoluta, maislhes inspira temor do que simpatia?Os pais não levam seus filhos aos zoológicos para lhes passar noções deecologia. Nada nestes passeios lhes é dito sobre o homem estardestruindo os hábitats dos animais e que muitos deles estão ameaçadosde extinção. Quem faz este tipo de abordagem ao seu filho em um zoológico?Quem lhes fala que aqueles animais não deveriam estar ali? Que elespreferiam estar em suas casas, a natureza ? Que foram trazidos ,contrariando seus interesses mais genuínos que são o direito à vidajunto aos seus pares e em liberdade?Conta a história que um dia Deus disse a Noé, um patriarca muitorespeitado entre seu povo : Vai, constrói uma arca e coloca um par decada animal dentro dela porque farei chover muitos dias e muitasnoites, mas se cumprires minhas palavras, tu e os teus nãoperecerão..Noé assim fez. Ao final do grande dilúvio, as águas baixaram e Noéabriu a arca e soltou os animais. Muito tempo se passou desde então,muito tempo, mas as águas da incompreensão humana ainda não baixaram...Ainda ecoa no céus do tempo, os trovões da arrogância humana. Pensamos homens que as savanas ainda estão inundadas. Que o sol dasabedoria, aquela que traz luz e libertação aos seres, esse ainda nãosaiu. Por isso, os animais selvagens ainda continuam presos, cativos emzoológicos, aprisionados perpetuamente sem direito a apelação ourecurso.Cumprindo uma pena eterna, reproduzindo-se sem saberem que seus filhostambém serão prisioneiros, que jamais conhecerão as selvas, as savanas,as pradarias.Desconhecem a liberdade porque homens equivocados acreditam que podemdispor de suas vidas para ensinar a quem não quer ver, a quem não sabever.A privação da liberdade praticada contra os animais fere sua dignidadede seres vivos, sensíveis , passíveis de sofrer como nós. Fere seusinteresses de viverem em paz, segundo sua natureza. À nós humanos fica a reflexão.


Como disse Konrad Lorenz: " Quando estão em jogo dores que se podeevitar, recalcar, desviar a vista do sofrimento dos animais pode serperigoso caso se torne um hábito".


Vanilda Moraes Pintos


Médica Veterinária
Coordenadora do Grupo Amigo Bicho & Companhia da Sociedade Vegetariana Brasileira-Rio Grande/RS